Natural de Afonso Cláudio, Amaro Lima é um cantor, compositor, multi-instrumentista e produtor notório pelo seu trabalho como vocalista e baixista do Manimal, grupo que mostrou uma particular e inovadora sonoridade ao fundir arranjos do rock com o congo. Após uma década neste projeto, Lima percebeu que precisava “de um tempo para sonhar outras coisas” e logo deu início à sua carreira solo. Com destaque ao sucesso de vendas do disco de releituras Coletivo (2007) e o álbum de autorais Moborama (2009), seus últimos lançamentos foram a coletânea Hits! …E Outras Músicas do Arquivo (2019) e o single “Fogo no Tambor”.
Confira abaixo a íntegra da conversa que tivemos sobre esses tempos de pandemia e não deixe de ler as reflexões feitas por vários outros artistas capixabas na nossa série Quarentalks.
João Depoli: Nós brasileiros acompanhamos com relativa antecedência a evolução dessa pandemia ao redor do mundo. Ainda assim, o ato de entrar em quarentena provou-se ser algo mais fácil de ser compreendido na teoria do que na prática. Você acredita que estava preparado para isso?
Amaro Lima: Acho que ninguém estava preparado pra passar tanto tempo isolado. Tenho tentado viver um dia após o outro, sem criar expectativas. Criei uma disciplina dentro de casa pra me ocupar e não pirar nesse período.
Como você tem lidado com o fato de que parte de suas atividades, planos e até mesmo fontes de renda foram reduzidas, adiadas ou até mesmo extintas?
Amaro Lima: Já passamos por várias transformações no mundo da música e em todas elas fomos obrigados a nos adaptar. Dessa vez não vai ser diferente. Todos estão descobrindo outras formas de levantar alguma renda. Pra quem tem as apresentações ao vivo como principal fonte, é difícil segurar a barra por tanto tempo. Já na parte de produção, no meu caso, tenho trabalhado bastante. Compondo, produzindo pro meu canal do YouTube etc.
Desde que entramos nessa, vimos que o isolamento teve diversos reflexos nas pessoas. Enquanto uns não notaram muita diferença em seu cotidiano, alguns viram seus problemas com depressão sendo amplificados, outros passaram por crises de ansiedade e mais. Como tem sido a sua adaptação a esse período?
Amaro Lima: Quem está fazendo o isolamento vive uma montanha russa emocional. Pra mim, o mais importante foi criar uma rotina pra diminuir os efeitos disso. A música sempre teve esse papel na minha vida. Nos momentos mais difíceis ela me conforta, me cura e me mostra um caminho.
“A disputa de poder político está tirando muitas vidas e arrasando com nossa economia”.
Enquanto alguns defendem que o isolamento deve ser absoluto, outros o enxergam como um exagero e toda essa discussão parece apenas amplificar esse período de extrema divisão social que já vivemos. Nesse contexto, o que você acha que esse momento significa para nós como sociedade?
Amaro Lima: Na minha opinião, a solução desse problema não é linear (isolar ou não) e não adianta pensar agora no que poderia ter sido feito. No final das contas, a disputa de poder político está tirando muitas vidas e arrasando com nossa economia. Enquanto isso, tentamos fazer a nossa parte.
Acha que é possível tirarmos algo positivo de um período como esse?
Amaro Lima: Toda vez que a gente aprende algo em alguma situação, pode ser considerado positivo. Todos nós estamos aprendendo alguma coisa nesse momento.
Num foco mais pessoal, o que você descobriu sobre si mesmo ou aprendeu nesse período de introspecção?
Amaro Lima: Muita coisa ainda está mudando em mim. Acho que só vou ter essa resposta quando tudo isso acabar definitivamente.
“A música tem uma força sensorial”.
Quando se trata de compor ou trabalhar num projeto criativo, muitas pessoas naturalmente buscam um certo isolamento. Esse período tem sido favorável para você nesse sentido?
Amaro Lima: Estou isolado, mas não estou sozinho em casa. Então, quando preciso parar pra compor, tenho que encontrar um horário onde todos da casa estão mais de boa [risos]. Tenho organizado meu tempo em estudar, compor, gravar e editar os vídeos para o YouTube. Também tiro um tempo para ver filmes e jogar videogame pra dar uma relaxada.
Como você espera que o seu trabalho possa contribuir tanto no período durante quanto no pós-quarentena?
Amaro Lima: A música está ajudando muita gente durante a quarentena — incluindo, eu mesmo. Estou produzindo um novo material e reunindo algumas coisas que gravei antes do isolamento pra lançar. A música tem uma força sensorial. Tenho tentado compor com uma mensagem mais positiva — o que me ajuda a passar esse período e espero que ajude outras pessoas também.
https://www.youtube.com/watch?v=1eO2qYnVOuU
Por fim, muito se especula sobre como será o convívio social num período pós-quarentena e os seus impactos em toda a cadeia musical. Quais são as suas expectativas para esse novo capítulo?
Amaro Lima: Tudo vai mudar, de alguma forma. Não dá pra criar expectativa. Vamos viver dia após dia e se adaptar, novamente, quando for a hora.
Texto: João Depoli | @joaodepoli.