Marcus Luiz (Intóxicos): “Somos vistos como o exemplo a não ser seguido.”

Leia na íntegra o papo que tive com o Marcus Luiz sobre esse período de quarentena e os seus desdobramentos atuais e futuros
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Marcus Luiz (Intóxicos) ao vivo no Rádio Garagem Festival (Crédito: Aclamada Melancolia Underground).
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Marcus Luiz é uma figura presente na cena alternativa de Vila Velha há alguns anos. Seu mais recente trabalho configura-se no papel de guitarrista do trio instrumental de surf music Intóxicos. Junto de seu irmão, o baterista Bernardo Tourinho, e o baixista Rafael de Almeida, Marcus fez sua estreia em 2015 com o disco Vila Velha Todo Dia. Três anos depois, o trio deu continuidade ao projeto retratando uma cidade à beira do colapso no apocalíptico End Times, seu segundo álbum.

Confira abaixo a íntegra da conversa que tivemos e não deixe de ler sua participação ao lado de André Prando, Larissa Pacheco (Big Bat Blues Band), João Lucas Ribeiro (Muddy Brothers), Henrique Mattiuzzi (Amanita Flying Machine) e Patricia Ilus no terceiro episódio da série Quarentalks.

João Depoli: Nós brasileiros acompanhamos com relativa antecedência a evolução dessa pandemia ao redor do mundo. Ainda assim, o ato de entrar em quarentena provou-se ser algo mais fácil de ser compreendido na teoria do que na prática. Você acredita que estava preparado para isso?

Marcus Luiz: O Brasil hoje poderia ser um exemplo positivo no combate à pandemia se tivéssemos agido com responsabilidade e antecedência, mas infelizmente temos um governante completamente despreparado e irresponsável. Não estávamos preparados para isso, estamos nos adaptando, mas infelizmente ainda tem gente que menospreza a gravidade da situação.

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Como você tem lidado com o fato de que parte de suas atividades, planos e até mesmo fontes de renda foram reduzidas, adiadas ou até mesmo extintas?

Ainda estamos tentando nos acostumar. Muitos planos foram adiados ou cancelados e muita coisa está tendo que ser reinventada. Quando essa fase mais crítica passar, poderemos compreender com mais clareza como caminharão as coisas. Ainda há muitas incertezas.

Desde que entramos nessa, vimos que o isolamento teve diversos reflexos nas pessoas. Enquanto uns não notaram muita diferença em seu cotidiano, alguns viram seus problemas com depressão sendo amplificados, outros passaram por crises de ansiedade e mais. Como tem sido a sua adaptação a esse período?

Pra mim, a adaptação está sendo tranquila, porque minha rotina não mudou drasticamente — mas ainda há muita preocupação com os mais vulneráveis e com quem precisa se expor diariamente. Pra muitas pessoas, as mudanças estão sendo muito prejudiciais financeira e emocionalmente. De alguma forma, todos nós sairemos afetados, mas se cada um tiver o mínimo de consciência, os danos serão menores. O momento é de focar em tomar as medidas corretas, seguir os conselhos de especialistas, ajudar quem precisa, difundir informações importantes e ter paciência.

“Fazer um isolamento frouxo só vai prolongar o sofrimento.”

Enquanto alguns defendem que o isolamento deve ser absoluto, outros o enxergam como um exagero e toda essa discussão parece apenas amplificar esse período de extrema divisão social que já vivemos. Nesse contexto, o que você acha que esse momento significa para nós como sociedade?

Para o Brasil, uma derrota. Somos vistos como o exemplo a não ser seguido. Falta uma liderança de verdade, alguém que pense nos brasileiros com empatia. Sabemos que a única medida eficaz até então é o isolamento social rígido, mas, ao invés disso, estamos batendo recordes negativos, cortando verbas, contestando a ciência, reabrindo comércio etc. Fazer um isolamento frouxo só vai prolongar o sofrimento.

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Marcus Luiz (esq). e a banda Intóxicos (Crédito: Divulgação).

Acha que é possível tirarmos algo positivo de um período como esse?

Espero que sim. Que as pessoas passem a tratar o próximo com mais respeito, atenção, carinho e que sejam mais racionais na hora de escolher quem vai conduzir o país.

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Num foco mais pessoal, o que você descobriu sobre si mesmo ou aprendeu nesse período de introspecção?

Pessoalmente, não acho que mudou muito, mas é bom enfatizar que devemos valorizar mais nossas famílias e amigos, aproveitar melhor os momentos de lazer, manter o foco em ficar bem e fazer bem aos outros.

“Nosso som transmite uma energia positiva e queremos continuar seguindo este caminho.”

Quando se trata de compor ou trabalhar num projeto criativo, muitas pessoas naturalmente buscam um certo isolamento. Esse período tem sido favorável para você nesse sentido?

Compor é um processo mais natural do que induzido. Vejo prós e contras. Como banda, é importante ter interação entre os membros e viver experiências que tragam inspirações para as criações. No nosso caso, as coisas estão fluindo bem. Fizemos uma live, produzimos alguns vídeos e estamos começando a produção de um EP. Mas isso só está sendo possível, porque meu irmão, que também é da banda, está morando comigo.

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Surf music à beira da praia com Intóxicos (Crédito: Divulgação),

Como você espera que o seu trabalho possa contribuir tanto no período durante quanto no pós-quarentena?

Pelo fato de sermos uma banda instrumental, nunca nos preocupamos em passar uma mensagem tão direta através do som, mas sempre tentamos nos comunicar visualmente, através dos vídeos, capas dos discos, figurino, posts etc. Acreditamos que nosso som transmite uma energia positiva e queremos continuar seguindo este caminho.

Por fim, muito se especula sobre como será o convívio social num período pós-quarentena e os seus impactos em toda a cadeia musical. Quais são as suas expectativas para esse novo capítulo?

Como já tem ocorrido, os principais movimentos serão virtuais. A princípio continuaremos tendo muitas apresentações através de lives e, posteriormente, apresentações presenciais apenas em lugares adequados, com público limitado de acordo com cada situação e com muita cautela. A criatividade vai ser fundamental.

Texto: João Depoli | @joaodepoli.

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